O legado do Apple II no cenário do desenvolvimento de jogos japonês é inegável, com exemplos bem documentados de sua influência em títulos icônicos. Contudo, algumas conexões são mais sutis, como a possível influência de Aztec em Metroid. Este artigo explora as semelhanças notáveis entre o jogo de aventura de 1982 da Datamost para Apple II e o aclamado clássico de 1986 da Nintendo, investigando se o título ocidental moldou, de alguma forma, um dos pilares do gênero Metroidvania.
O Legado do Apple II no Desenvolvimento Japonês
A influência do Apple II no Japão transcende a mera adoção tecnológica; ela moldou a própria gênese de alguns dos mais importantes RPGs japoneses. Desenvolvedores como Yuji Horii e Koichi Nakamura se inspiraram em jogos como Wizardry e Ultima no sistema para criar Dragon Quest, um marco fundamental. Similarmente, Nasir Gebelli, um talentoso programador de Apple II, foi recrutado pela Squaresoft, onde sua expertise culminou na criação de Final Fantasy. Até mesmo a Nihon Falcom, hoje gigante da indústria, iniciou sua jornada vendendo computadores Apple II.
Esses são apenas alguns exemplos que evidenciam o impacto profundo do Apple II na cultura de desenvolvimento de jogos do país. No entanto, a repercussão do sistema não se limitou a esses nomes consagrados. Muitas vezes, a inspiração veio de fontes menos óbvias, como o jogo Aztec, lançado em 1982 pela Datamost. Sua chegada ao Japão dois anos antes do lançamento de Metroid no Famicom Disk System abriu portas para uma curiosa especulação.

Manabu Yamana e a Pista de Aztec no Japão
A presença de Aztec no Japão e sua possível reverberação são confirmadas por figuras notáveis da indústria. Manabu Yamana, conhecido como o programador-chefe de Dragon Quest III na Chunsoft em 1988 e diretor de Dragon Quest V, iniciou sua carreira de programação em 1983. Antes de sua ascensão, ele trabalhou em projetos para uma empresa pouco conhecida chamada ZAP, onde concebeu um jogo de ficção científica que, segundo suas próprias palavras em uma entrevista para The Untold History of Japanese Game Developers, jogava “meio como o jogo Aztec para Apple II”.
Embora esse projeto ambicioso nunca tenha sido lançado – e tenha levado Yamana a buscar outras oportunidades de emprego –, sua menção explícita a Aztec serve como uma evidência concreta de que o jogo ocidental era conhecido e respeitado por desenvolvedores japoneses da época. O próprio Aztec, um jogo desenvolvido no ocidente por Paul Stephenson, foi portado para diversas plataformas após seu lançamento inicial no Apple II, incluindo os computadores japoneses PC-88, Sharp X1 e FM-7, chegando ao mercado nipônico oficialmente em 1984, publicado pela Comptiq. Isso estabelece um cronograma crucial para a discussão sobre a influência de Aztec em Metroid.
Paralelos Surpreendentes: Aztec e Metroid
As semelhanças entre Aztec e Metroid são tão marcantes que levantam questões inevitáveis sobre uma possível inspiração direta. Ambos são jogos de ação-plataforma com forte ênfase na exploração de labirintos subterrâneos. Neles, os jogadores coletam itens essenciais para progredir e armas para combater inimigos bizarros. Uma mecânica central compartilhada é a capacidade de usar bombas para abrir caminho, explodindo paredes e pisos para acessar novas áreas. Em Aztec, o jogador se agacha e rasteja para posicionar as bombas; em Metroid, essa função é análoga ao icônico modo Morph Ball.
Além das mecânicas de gameplay, há também paralelos visuais intrigantes. O inimigo dinossauro de Aztec, por exemplo, exibe uma semelhança surpreendente com Ridley, um dos chefes mais reconhecíveis de Metroid. A própria estrutura dos mapas, embora o de Aztec seja mais horizontal e o de Metroid mais vertical, evoca uma sensação de familiaridade para quem conhece ambos os títulos. O fato de Aztec ter chegado ao Japão oficialmente e sido amplamente divulgado em revistas e lojas de eletrônicos por quase dois anos antes do lançamento de Metroid em 1986 reforça a tese de que a equipe da Nintendo poderia ter tido contato com o jogo.

A Recepção de Aztec no Japão e o Mistério de Seu Criador
Contrariando a ideia de que Aztec seria apenas um lançamento obscuro do ocidente, o jogo angariou uma base de fãs considerável no Japão. Conforme o arquivista de computadores e desenvolvedor de jogos Takayuki Komabayashi revelou, o livro Pasocom Game Ranking Book de 1983 atribuiu 86 pontos a Aztec, classificando-o logo abaixo de Ultima I, II. As revistas de computadores japonesas frequentemente destacavam jogos do Apple II, e Aztec estava entre eles. Isso demonstra que o público japonês estava ciente do jogo e o apreciava, mesmo antes das conversões oficiais para hardware doméstico.
Dada essa popularidade e a clara inspiração que Yamana retirou de Aztec, a questão sobre a equipe de Metroid é mais do que pertinente. O Famicom foi lançado em 1983, e é provável que o diretor Satoru Okada e sua equipe estivessem cientes de Aztec quando ele chegou ao Japão em 1984. Apesar da oportunidade em várias entrevistas, a pergunta sobre essa possível influência de Aztec em Metroid nunca foi feita diretamente a Okada ou a outros membros chave da equipe original, como o artista Yoshio Sakamoto ou o roteirista Makoto Kano. Infelizmente, o tempo é um fator limitante para obter essas respostas, já que muitos desses pioneiros estão em idades avançadas.
Por trás de Aztec estava um único homem, Paul Stephenson. Sua proeza em criar um jogo tão complexo e influente sozinho é notável. Curiosamente, Stephenson desapareceu do cenário público. Desde meados dos anos 90, e mesmo com apelos de figuras proeminentes como John Romero em 2014, ninguém conseguiu encontrá-lo. Uma resposta enigmática em uma postagem de Romero no Twitter sugeriu que Paul Stephenson faleceu em abril de 2001, uma informação que, embora difícil de verificar, encerra o mistério sobre o criador de Aztec. Essa lacuna impede a obtenção de uma confirmação definitiva sobre o jogo que talvez tenha plantado uma das primeiras sementes do gênero Metroidvania.
