
A década de 90 foi sem dúvida alguma a era dourada dos jogos de luta, e nenhuma franquia marcou tanto essa época quanto Street Fighter. Enquanto Street Fighter II dominava os arcades ao redor do mundo, poucos imaginavam que a Capcom estava secretamente desenvolvendo uma sequência que não apenas expandiria o universo da série, mas também introduziria mecânicas revolucionárias que influenciariam gerações futuras de fighting games.
Street Fighter Alpha, conhecido no Japão como Street Fighter Zero, surgiu em 1995 como uma das maiores surpresas da história dos videogames. Mas como exatamente nasceu esse clássico? E qual foi seu impacto na cronologia da franquia Street Fighter? Prepare-se para uma viagem nostálgica pelos bastidores de um dos jogos mais importantes já criados.
A Era Dourada do Street Fighter II e Seus Desdobramentos
Para entender completamente a importância de Street Fighter Alpha, precisamos primeiro revisitar o fenômeno que foi Street Fighter II. Lançado em 1991, SF II não apenas salvou a Capcom de uma possível crise financeira, mas também redefiniu completamente o que esperávamos de um jogo de luta.

Yoshinori Ono e sua equipe na Capcom sabiam que tinham uma fórmula mágica em suas mãos. Consequentemente, a empresa decidiu explorar ao máximo o sucesso do título, lançando diversas versões incrementais. Street Fighter II: Champion Edition chegou em 1992, seguido por Street Fighter II Turbo: Hyper Fighting em 1992, e finalmente Super Street Fighter II em 1993.
Cada uma dessas versões adicionava novos personagens, balanceamento de gameplay e pequenas melhorias técnicas. Super Street Fighter II introduziu Cammy, Dee Jay, T. Hawk e Fei Long, expandindo significativamente o roster de lutadores. Posteriormente, Super Street Fighter II Turbo chegou em 1994, adicionando Akuma como personagem secreto e introduzindo o revolucionário sistema de Super Combos.
O Nascimento Secreto do Projeto Zero
Enquanto o mundo dos arcades celebrava cada nova versão de Street Fighter II, uma pequena equipe dentro da Capcom trabalhava secretamente em algo completamente diferente. Takeshi Tezuka, diretor do projeto que se tornaria Street Fighter Alpha, tinha uma visão ambiciosa: criar um jogo que funcionasse tanto como sequência quanto como prequela da série.

A ideia central era explorar a juventude de Ryu e Ken, mostrando como esses icônicos lutadores desenvolveram suas habilidades antes dos eventos de Street Fighter II. Adicionalmente, a equipe queria introduzir personagens de Final Fight no universo Street Fighter, criando uma continuidade narrativa entre as duas franquias da Capcom.
Akira Nishitani, designer chefe do projeto, revelou anos depois que a equipe estava determinada a não apenas criar mais uma versão de Street Fighter II. Eles queriam revolucionar completamente a jogabilidade, introduzindo mecânicas que nunca haviam sido vistas em jogos de luta.
Street Fighter Alpha: A Revolução Técnica de 1995
Street Fighter Alpha finalmente chegou aos arcades japoneses em junho de 1995, causando um impacto imediato na comunidade gamer. O jogo utilizava o hardware CPS-II da Capcom, mas com uma abordagem visual completamente nova que combinava sprites desenhados à mão com efeitos visuais inovadores.
O sistema de gameplay representou uma evolução radical em relação a Street Fighter II. O Super Combo Gauge agora tinha três níveis, permitindo aos jogadores executar diferentes tipos de ataques especiais dependendo da quantidade de energia acumulada. Além disso, o jogo introduziu o Alpha Counter, uma mecânica defensiva que permitia contra-atacar durante o bloqueio.
Guy e Sodom, personagens originalmente de Final Fight, fizeram sua estreia na série Street Fighter, junto com novos lutadores como Rose, Dan Hibiki e Birdie. Cada personagem possuía movimentos únicos e estilos de luta completamente distintos, oferecendo uma diversidade de gameplay nunca vista anteriormente.
A trilha sonora, composta por Takayuki Iwai, também merece destaque especial. As músicas de Street Fighter Alpha tinham um tom mais melancólico e nostálgico, perfeitamente adequado à natureza de prequela do jogo. Faixas como o tema de Ryu se tornaram instantaneamente icônicas e são lembradas até hoje pelos fãs.
A Cronologia Complexa: Entendendo a Linha do Tempo
Uma das características mais fascinantes de Street Fighter Alpha é sua posição cronológica dentro da série. Diferentemente de outras sequências que simplesmente continuam a história anterior, Alpha funciona como uma prequela dos eventos de Street Fighter II.
Cronologicamente, a série se organiza da seguinte forma: Street Fighter (1987) → Street Fighter Alpha (1995) → Street Fighter Alpha 2 (1996) → Street Fighter Alpha 3 (1998) → Street Fighter II (1991) → Street Fighter IV (2008) → Street Fighter V (2016).
Esta linha temporal permite que a Capcom explore diferentes períodos da vida dos personagens. Em Street Fighter Alpha, por exemplo, Ryu ainda está buscando seu verdadeiro potencial como lutador, enquanto Ken mantém uma personalidade mais jovem e impetuosa. Chun-Li aparece como uma jovem investigadora da ICPO determinada a vingar a morte de seu pai.
Akuma, conhecido como Gouki no Japão, também recebe um desenvolvimento narrativo significativo. Sua rivalidade com Ryu e a influência do Satsui no Hado (Impulso Assassino) são exploradas de forma muito mais profunda do que em Street Fighter II.
Street Fighter Alpha 2: Aperfeiçoando a Fórmula
O sucesso de Street Fighter Alpha garantiu rapidamente uma sequência. Street Fighter Alpha 2 chegou aos arcades em 1996, introduzindo melhorias significativas no sistema de gameplay e adicionando novos personagens ao roster.
Sakura Kasugano fez sua estreia como uma estudante colegial obcecada por Ryu, tornando-se instantaneamente uma das personagens mais populares da franquia. Rolento, outro veterano de Final Fight, também se juntou ao elenco, junto com Dhalsim e Zangief de Street Fighter II.

O sistema Custom Combo foi a grande inovação de Alpha 2. Esta mecânica permitia aos jogadores criar combinações personalizadas de ataques, consumindo todo o Super Combo Gauge em troca de liberdade criativa total. Competidores profissionais rapidamente descobriram combinações devastadoras que tornaram o jogo extremamente popular nos torneios.
Gen, mestre de Chun-Li em algumas versões da cronologia, também retornou à série após sua ausência desde o Street Fighter original. Seu estilo de luta único, alternando entre os estilos Mantis e Crane, adicionou uma camada extra de complexidade estratégica ao jogo.
Street Fighter Alpha 3: O Ápice da Série Alpha
Street Fighter Alpha 3, lançado em 1998, representou o ápice absoluto da série Alpha. Com o maior roster já visto em um jogo Street Fighter até então, Alpha 3 incluía praticamente todos os personagens das versões anteriores, além de novos lutadores como Karin Kanzuki, Rainbow Mika e Cody.

O sistema V-ISM (Variable) revolucionou novamente a jogabilidade, oferecendo três estilos diferentes de luta: X-ISM (similar ao Street Fighter II), A-ISM (baseado nos jogos Alpha anteriores) e V-ISM (focado em Custom Combos). Esta flexibilidade permitia que cada jogador escolhesse o estilo que melhor se adequava às suas preferências.
Cody, protagonista de Final Fight, apareceu em Alpha 3 como um lutador desiludido e rebelde, mostrando como sua vida mudou após os eventos do jogo original. Esta abordagem narrativa mais madura demonstrava a evolução da Capcom em termos de storytelling.
A versão Dreamcast de Street Fighter Alpha 3, lançada posteriormente, incluiu personagens adicionais como Evil Ryu e Shin Akuma, versões alternativas que exploravam ainda mais o conceito do Satsui no Hado.
O Impacto Cultural e Técnico dos Jogos Alpha
A série Street Fighter Alpha não apenas expandiu o universo narrativo da franquia, mas também estabeleceu padrões técnicos que influenciariam toda a indústria de jogos de luta. O sistema de Super Combos em múltiplos níveis se tornou padrão em praticamente todos os fighting games subsequentes.
Evo, o maior torneio de jogos de luta do mundo, frequentemente inclui jogos da série Alpha em sua programação oficial. Street Fighter Alpha 3 permanece extremamente popular na comunidade competitiva, com jogadores descobrindo novas estratégias e combinações mesmo décadas após seu lançamento original.
A influência visual dos jogos Alpha também não pode ser subestimada. O estilo artístico mais colorido e expressivo influenciou diretamente o desenvolvimento de Street Fighter III e posteriormente Street Fighter IV. Kinu Nishimura, artista responsável pelos designs de personagens, criou algumas das ilustrações mais icônicas da história dos videogames.
A Transição Para Street Fighter III e Além
Após o sucesso da série Alpha, a Capcom decidiu dar um salto temporal significativo com Street Fighter III, lançado em 1997. Este jogo se passa cronologicamente após Street Fighter II, apresentando uma nova geração de lutadores liderada por Alex.

Street Fighter III introduziu o revolucionário sistema Parry, que permitia aos jogadores defender-se de ataques no timing exato, criando oportunidades de contra-ataque. Embora inicialmente recebido com certa resistência por parte dos fãs, Street Fighter III: Third Strike (1999) eventualmente se tornou um dos jogos mais respeitados da série.
A cronologia se tornou ainda mais complexa com Street Fighter IV em 2008. Este jogo se passa entre Street Fighter II e Street Fighter III, introduzindo novos personagens como Abel, Crimson Viper e Rufus, além de trazer de volta lutadores clássicos com visuais completamente renovados.
Street Fighter V e a Era Moderna
Street Fighter V, lançado em 2016, continua a tradição de expansão narrativa da série. O jogo se passa após Street Fighter IV mas antes de Street Fighter III, preenchendo mais lacunas na cronologia complexa da franquia.
O sistema V-System de Street Fighter V claramente se inspira nas inovações introduzidas pela série Alpha. V-Skills, V-Triggers e V-Reversals ecoam respectivamente os Alpha Counters, Super Combos e outras mecânicas pioneiras dos jogos dos anos 90.
Personagens originários de Street Fighter Alpha, como Karin, R. Mika e Birdie, retornaram em Street Fighter V com designs atualizados mas mantendo suas personalidades características. Esta continuidade demonstra o impacto duradouro da série Alpha na identidade da franquia.
O Legado Duradouro de Street Fighter Alpha
Hoje, mais de 25 anos após o lançamento original, Street Fighter Alpha continua sendo celebrado como um dos maiores jogos de luta já criados. Sua influência transcende o próprio gênero, inspirando desenvolvedores ao redor do mundo a experimentar com narrativas não-lineares e mecânicas inovadoras.
Street Fighter 6, o mais recente capítulo da série lançado em 2023, inclui referências diretas aos jogos Alpha. O Drive System combina elementos dos Super Combos, Focus Attacks e outras mecânicas estabelecidas ao longo da história da franquia.
A Capcom ocasionalmente relança os jogos Alpha em coletâneas como Street Fighter Alpha Anthology e Street Fighter 30th Anniversary Collection, garantindo que novas gerações de jogadores possam experimentar esses clássicos. Adicionalmente, a empresa tem demonstrado interesse em revisitar a era Alpha com novos projetos.
Uma Revolução Que Mudou Tudo
Street Fighter Alpha não foi apenas mais um jogo de luta da década de 90. Foi uma revolução completa que redefiniu as expectativas dos fãs, estabeleceu novos padrões técnicos e criou uma narrativa complexa que ainda hoje fascina jogadores ao redor do mundo.
A decisão corajosa da Capcom de criar uma prequela em vez de uma sequência direta resultou em uma das franquias mais respeitadas da história dos videogames. Street Fighter Alpha provou que inovação e nostalgia podem coexistir harmoniosamente, criando experiências que transcendem gerações.
Consequentemente, quando pensamos na evolução dos jogos de luta, Street Fighter Alpha permanece como um marco fundamental. Sua influência continua sendo sentida em cada novo Street Fighter lançado, garantindo que o legado dessa obra-prima permaneça vivo para sempre.